Um “jabuti” levou o Senado Federal a aprovar quarta-feira (21/10/15) o “RDC Lava Jato”. Ou seja, o projeto que autoriza o uso do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) em licitações e contratos na área de segurança pública, na realização de obras e serviços de engenharia relacionados à mobilidade urbana (tais como VLTs e metrô) e na ampliação de infraestrutura logística (como estradas e portos). O assunto interessa diretamente as empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato, pois uma das modalidades de licitação permitida é a “contratação integrada”, em que a administração pública licita uma obra com base apenas em anteprojeto, expediente utilizado nos empreendimentos da Copa, das Olimpíadas e diversos outros do PAC, boa parte realizada por grandes construtoras.
“Jabuti” é como são conhecidas as matérias que fogem do escopo original de um projeto de lei e pegam ‘carona” durante sua tramitação. No caso de ontem, tratou-se da emenda que autoriza a renegociação das dívidas dos produtores rurais que nos anos 70 aderiram ao programa Proálcool, incluída durante a discussão da Medida Provisória 678/2015 na Câmara.
“É lamentável, inacreditável mesmo, que por causa de um “jabuti”, o Senado tenha aprovado matéria amplamente discutida e derrotada no ano passado, que foi a generalização do uso do RDC em todas as obras públicas do país”, declarou Haroldo Pinheiro, presidente do CAU/BR. “Em última instância, estamos entregando para as empreiteiras o planejamento e a definição da qualidade dos espaços e edificações públicas de nossas cidades”.
Há poucos dias, o Supremo Tribunal Federal decidiu que esse tipo de procedimento é inconstitucional, como lembrou o relator do projeto, senador Telmário Mota (PDT-RJ), recomendando a rejeição do Projeto de Lei de Conversão No. 17, nome que a MP ganhou no Senado. O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), porém, observou que a decisão do STF sequer foi publicada, e recorreu à Mesa para encaminhar voto contrário ao parecer e prevalecer o texto aprovado no último dia 13 na Câmara.
O documento, que no Senado virou o Projeto de Lei de Conversão No. 17, originalmente previa o uso do RDC apenas para ações de segurança pública, defesa civil e inteligência, com o objetivo imediato de facilitar a montagem das operações de segurança para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016, no Rio de Janeiro. Tudo o mais foi incluído – inclusive outros “jabutis” – pela Comissão Mista que examinou a MP e pela Câmara que a aprovou.
Entre outras inclusões constam ainda o uso do RDC em obras dos sistemas públicos de ensino, pesquisa, ciência e tecnologia Também haverá permissão para licitar pelo RDC a administração de presídios e unidades de tratamento socioeducativo para jovens infratores. E até a mesmo a locação de bens móveis e imóveis para a administração pública.
SANÇÃO PRESIDENCIAL – o “jabuti” agora passa para as mãos da presidente Dilma Rousseff. Se ela sancionar a MP como o Senado aprovou, contrariar o reajuste fiscal proposto pelo governo. Ela pode também rejeitar apenas os “jabutis” alegando que são inconstitucionais. Se isso ocorrer, a presidente ficará desgastada com os pequenos e médios produtores rurais e talvez essa tenha sido a razão do líder do governo no Senado, José Pimental (PT-CE), ter apoiado o parecer do relator. De qualquer forma, o “RDC Lava Jato” de interesse das grandes empreiteiras estará consumado.
Durante a sessão, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) apresentou requerimento de inversão, com preferência para votação do texto original da MP, e não do PLV. O requerimento foi rejeitado (37 votos contrários, 24 votos favoráveis e duas abstenções). Curioso notar que votaram com ele o líder do governo, o líder do PT, a líder do PCdoB e do PDT, todos da base governista.
O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) criticou a adoção “rotineira” do RDC, que vem sendo usado há 12 anos, e disse que a prática favorece a abertura das “portas da corrupção”.
OUTROS “JABUTIS” – Foram feitas ainda alterações na Lei de Execução Penal para permitir que os presídios terceirizem setores como telecomunicações, reprografia (reprodução de documentos), lavanderia, e manutenção. Também será permitido terceirizar os serviços relacionados à execução de trabalho pelos presos. Na Câmara dos Deputados, esses dispositivos geraram controvérsia por supostamente abrirem a possibilidade de privatização no sistema prisional.
Também foi acoplada à MP a prorrogação da data para os municípios acabarem com os lixões e criarem aterros sanitários. O prazo, que acabou em agosto deste ano, fica agora para 2018. Esta foi a terceira tentativa feita pelo Congresso de estender esse prazo. Duas outras não prosperaram devido a perda de validade da matéria e um veto presidencial. Neste último caso, o Executivo argumentou que a prorrogação iria contrariar o interesse público por adiar a consolidação de aspectos importantes da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Com informações da Agência Senado